Contraditório
há +205 semanas
“Contraditório”
“Não pode ser!” – exclamou Alberto, incrédulo, quando Ernestina, chefe de loja da RevShops, se queixou dos problemas criados pela Elsa. Não esperava isso dela! Sempre considerara aquele tipo de comportamentos inaceitáveis e, neste caso, sentia-se particularmente irritado porque tinha sido ele que a recomendara à empresa.
A RevShops possuía a maior rede de papelarias do país, estando presente em todos os aeroportos e nos maiores centros comerciais. Assente num conceito inovador, as lojas eram espaçosas, modernas, bonitas, alegres, funcionais e comercialmente muito eficazes.
A equipa da Rev estava em sintonia com o “look & Feel” das lojas. Jovem, dinâmica, competente, com muitas moças bonitas e um ambiente alegre e informal. Era liderada por Raul, que ao longo dos anos tinha construído uma cultura à sua imagem. Tinha um particular cuidado na seleção das “Caixeiras” e na escolha das “Chefes de Lojas”. Raul tinha sido Gestor de Recursos Humanos durante alguns anos e tinha compreendido que o sucesso de qualquer projeto profissional passava por equipas competentes, comprometidas e alinhadas com os objetivos. Defendia que lojas eram um negócio de pessoas para pessoas e, por isso, o investimento no recrutamento, desenvolvimento e retenção nunca era de mais.
Alberto conhecia Elsa desde que ela começara a namorar com o seu amigo Daniel. Gostara dela desde o primeiro dia. Aparentava ser uma pessoa simpática, ponderada, prestável e responsável. Quando ela lhe pediu ajuda para encontrar um emprego, não hesitou em a colocar num processo de recrutamento e seleção, até porque sabia que o Daniel estava com problemas de saúde muito complicados e que eles, entretanto casados, estavam a necessitar de ajuda.
A Elsa foi colocada na Loja de Cascais e Alberto foi recebendo, ao longo dos meses, informações muito positivas sobre o seu desempenho. Dedicada, “team player”, preocupada com os clientes e com os resultados da loja, tornou-se, em pouco mais de um ano, num dos pilares da equipa, substituindo a Chefe de Loja quando ela tinha de se ausentar. Nada fazia prever o que se viria a passar.
Seriam finais de Janeiro, quando Alberto encontrou Ernestina na Sede da RevShops e lhe perguntou como estavam as coisas na sua loja. Foi então que ela lhe contou, visivelmente revoltada, o que se tinha passado. Elsa tinha-lhe pedido para ter férias em Dezembro e ela tinha recusado. Perante a sua repetida insistência, reafirmou-lhe que se tratava da época do ano em que a loja tinha mais movimento e maior faturação e, logicamente, a empresa não permitia o gozo de férias nesse período. A cerca de duas semanas do Natal, foi surpreendida com a entrega duma baixa da Elsa, da qual ainda não tinha regressado, o que lhe provocou problemas significativos para coordenar a equipa e a obrigou, muitas vezes, a ter de prolongar o seu turno.
Alberto possuía um elevado sentido de dever e considerava aquele tipo de atitude totalmente inaceitável. Era, na sua opinião de gestor de Recursos Humanos, uma situação que não podia passar impune. Ficou profundamente aborrecido e, mentalmente, tomou a decisão de não permitir a renovação do contrato a termo da Elsa.
Algumas semanas depois, num dos seus habituais “tours” pelas lojas, passou por Cascais e ficou surpreendido quando a Elsa se dirigiu a ele e lhe pediu “para lhe dar uma palavrinha”.
- Há algum tempo que queria falar consigo, disse Elsa, continuando, “voltei de baixa há cerca de uma semana e queria dar-lhe uma explicação. Como sabe, o meu marido tem uma doença oncológica em fase avançada (da qual viria a falecer passados alguns meses) e os médicos marcaram-lhe sessões de quimioterapia muito agressivas no mês de Dezembro e Janeiro. Ele necessitava da minha ajuda e eu não podia deixar de estar com ele nesta fase. Tentei colocar férias para não prejudicar a Rev, mas como a empresa não permite férias nessa altura, vi-me obrigada a meter uma baixa!
Obrigado, Elsa, por me contar, respondeu Alberto, o mais importante é que o Daniel recupere! Mais tarde, quando meditou sobre o assunto, recordou a frase de Séneca "Quem toma decisões sem ouvir todas as partes não pode ser considerado justo, ainda que decida com justiça.”
Sintra, 25 de Fevereiro de 2017
José Bancaleiro
Managing Partner
Stanton Chase International – Your Leadership Partner